Outono, take2
é melhor que seja ao Sol.
O ar ameno,
e cada um com a sua sombra a par.
Nem tudo há-de contrariar a pele
e a pele basta para abrigo.
O dia é exuberante e a marmelada
seca nas varandas.
copiado de Sofia
Edição Portuguesa de 'El Mal de Montano', de Enrique Vila Matas

Para os mais distraídos: Quinta feira no TAGV, às 21:30h, o reeencontro de um grande músico com uma cantora. Aquela sala já viveu uma noite inesquecível com Gismonti e esta promete.
Andar sem pensamento (4 e fecha)
Amor é na tripa
mas agora tenho um truque
faço força na barriga
e não te deixo chegar à cabeça
“Eu também sou contra. Hoje explodiu-me um terrorista nas mãos. Ainda não sei, mas acho que morri.”
Dei uma volta com algum tempo nos meus blogs. Foi esta madrugada. Por respeito para com a escrita nocturna de alguns e de algumas. Eu sei que isto não é vida. Bem gostava de seguir o conselho da ninfa: “Get a life”. Mas não consigo. Primeiro porque acho que sou um pré-rafaelita. Depois porque a língua italiana me é simultaneamente próxima e distante. Ao ouvi-la parece-me estar no limbo da compreensão, numa agradável sala pré-anestésica. Mas o núcleo da coisa escapa-me. Não me queixo, até é bom, se não houver avaliação final.
Desde as primeiras linhas de Todesfuge aos cadernos póstumos passa um caminho marcado pela experiência da construção de uma linguagem, descentrada, com a sua sintaxe fracturada, como que exposta ao grito de quem em todas as circunstâncias liberta a poesia do seu silêncio para a situar no grito de quem deseja nomear- e de que maneira- o acontecimento que assinalou a sua origem. Essa era a "sua zona de combate", o lugar onde se citam o esquecimento e a memória, o verdadeiro rosto da catástrofe, esse rosto que se ilumina extraordinariamente nas palavras do Discurso de Darmstadt de 1960 ao receber o prémio George Buchner: "escrever nas cinzas da linguagem", que é como dizer, naquele lugar em que a linguagem transformada por uma violência nova estala com o seu resplendor, permitindo enunciar o que antes tinha sido proscrito.
"Adormeci nos braços dele e acordei três vezes de noite. Sentia-me bem. Estava no quarto dele, no hotel que também era o meu, na cidade de L. Sentia-me bem no meu corpo, nos restos do champanhe, na cama larga de um hotel, numa cidade que não me era hostil. Levantei-me e ele não acordou. Fui à mochila abrir a caixa das mensagens do telemóvel. O meu namorado tinha respondido. Correctamente? Já não me lembrava da resposta certa. Aquela servia-me. Estava confusa. Lembrava-me da cara dele, umas horas antes. Eu não o conhecia bem e estava escuro. Mas era uma cara bonita e lembro-me de que não era exactamente a cara do homem com que me tinha deitado e que não tinha tido tempo para ver rir, sorrir, zangar-se, surpreender-se, olhar longamente, surpreender-se. Abri os olhos algumas vezes e o que via era a cara de alguém com quem nunca tinha estado assim tão próxima, tão intima, como se costuma dizer. Via surpreendentemente a cara de R., um homem que eu não me lembro de ter sequer desejado, que me surpreendeu um dia por falar com uma voz tão doce, tão próxima de um instrumento de sopro. Pensava: é o Mamute. Achava que por decência devia pensar: é o Mamute. Mas o Mamute era um braço que abria para um peito largo, eram duas mãos enormes nas minhas coxas. Tive pena de não ter dado tempo à sua cara, afinal bonita. De não ter dado tempo aos lábios, aos dentes, ao ângulo do maxilar. Alguma ruga devia haver na testa dele, algum sinal particular que ao abrir os olhos me desse uma cara apropriada ao Mamute com quem me deitara no quarto que não era o meu, no hotel da cidade de L. Mas não podia fazer nada contra aquilo que me estava a acontecer. E era bom estar com R., afinal com R., inesperadamente com R. Desliguei o telemóvel e voltei para a cama para o calor do corpo do Mamute. Agora li o que vocês escreveram. Acho que não percebem nada. A matéria de que é feita a fidelidade? Eu estava a falar dos corpos não encaixarem como costumam."

Elisabeth Costello editado em portugal pela D. Quixote. Não escrevo mais nada enquanto não acabar.
Estamos no quarto do hotel, na cidade de L. O reposteiro deixa entrar muito pouca luz. Estou no canto do sofá, aninhada. O Mamute pôs as mãos nas minhas coxas, desceu até aos joelhos, afastou-os e deixou-se cair em cima de mim, procurando –me a boca com sofreguidão. Senti-me enclausurada. Vi uma vez um mágico numa praça que se fazia rodear de cadeias e cadeados e depois começava uma dança de movimentos vermiculares para se libertar. Foi assim que me soltei e disse qualquer coisa na minha língua procurando refúgio na casa de banho. À pressa enviei um sms ao meu namorado: “Estás apaixonado?” Enquanto o escrevia pensava num teste de escolha múltipla. Todas as interrogações seriam castigadas. Sempre me enfurecem as hesitações. Mas que resposta queria de facto ouvir? Carreguei duas vezes no botão Send e voltei à sala. O Mamute acendera um candeeiro e estava sentado no canto que eu ocupara. Era enorme. Tinha as pernas estendidas, a camisa aberta, o cabelo desalinhado e sorria. Pareceu-me um rapaz com quem acampei uma vez. Dormimos duas noites semi vestidos. Eu deixava-me abraçar e acariciar mas resistia sempre às investidas quando elas requeriam maior intimidade. Fingia-me adormecida e quando aquilo se tornava quase insuportável e a cabeça era um concerto de penetração afastava-o determinada. Quando nasceu o dia vi a cara dele e tinha este mesmo sorriso pacificado que me parece ser o comprazimento na derrota. Este domínio da violência comoveu-me e aninhei-me no colo do Mamute. O telemóvel tremeu lá onde o deixara. Mas deixei de o ouvir quase ao mesmo tempo em que deixei de ver.//sent by Loreta Granada
Flaubert gritou: Eu sou Emma Bovary. Percebemos sempre o que esse grito significava e não era preciso ter feito amor num carro de vidros pintados. Que pena tenho de não poder gritar: Eu sou Loreta Granada. Pudesse e estava agora a escrever por ela, a viver por ela na cidade de L., ou lá onde ela está depois de L. Escrever por ela deve ser melhor do que esperar por ela. Pelo mail dela na caixa de A Natureza do Mal. O Joaquim diz que Loreta escolheu o Mal para escrever e que isso me devia alegrar. Então porque é que ela não escreve agora? Que terei eu escrito para ela me escolher? Ou foi Bonirre quem ela escolheu? Ou a ti, PC, que já nem sinto, sempre pensei que fosses mais radiação que matéria. Será que foi a florista que a sensibilizou para o mal? Eu volto a escrever sobre a mulher que talvez seja florista. Ou foram os posts políticos? Eu falo de política não tarda. Será que lhe desagradei por ter alterado o mail? Mas foi só o Larkin e umas vírgulas. Eu tiro o Larkin, o Larkin não significa nada para mim, eu sei que é tarde demais para mim, há mais gente a dizê-lo e de outras maneiras.
"Eu sou sentimental. Não aconteceu nada na minha vida que me fizesse assim, sou porque sim. Porque o mundo me devolve tudo maravilhado, por mais oposto aos factos que isso seja. Na cidade de L., tal e qual como nas outras cidades e dias, aconteceram coisas que eu pude encantar.
Hoje na primeira página de El Pais, Woody Allen, depois de receber um abraço de Almodovar, em Donostia, confessa a sua visão pessimista da vida: "Para mim a vida ou é trágica ou extremamente trágica".E depois: "Se Bush ganha, a tragédia será absoluta e automática".
Ela disse-lhe que não voltava, que era impossível, que aqueles não eram os seus dias de certezas. E acabou assim: Agora chama-me chata, obsessiva e desliga-me o telefone na cara.
Ah, estava a esquecer-me. Estás lindo Miguel, com a tua pele nova. Não fiques triste. Ela vai voltar a linkar-te.
Fui ver os meus blogs, os da coluna do lado e foi um bom fim de tarde. N O Esplanar RB traduz do italiano L'Usage du Monde de Emmanuel Carrère. Soberbo. O que aquilo não seria com El Pais. Por falar em comboios. Joaquim, se passares para Elsinore, e estiveres de acordo, eu subo na Estação Velha. O amarelo da bomba-inteligente continua lindo. O Azul Cobalto o mais secreto dos blogs. Em Controversa Maresia escreve uma admirável mulher do Norte. A Espuma já pôs a nu o empedrado.
Talvez ela não tivesse existido se Le Deuxième Sexe não fosse escrito. Mas ela nunca andou dois passos atrás de nenhum homem.
Hoje às 22 horas, na Figueira da Foz, no Centro de Artes e Espectáculos, Charles Lloyd, depois de uma primeira parte com Filipe Melo.
A questão do aborto é uma questão das mulheres grávidas. A pílula abortiva é uma coisa boa.
SOU O CHEFE MÁXIMO DAS FORÇAS ARMADAS. Eu ouvi. Ele disse:
sou o chefe máximo das forças armadas